sábado, 22 de fevereiro de 2014

Complemento

Esse padrão é realmente seu? O ideal foi construído por ti, ou foi imposto a ti?
O que é "padrão" num mundo multicultural, diverso, dinâmico, mutável?
O "padrão" existe? Ou é o "patrão" quem escreveu a palavra "padrão" seguindo o "siga" na tua cabeça? O padrão é o patrão, ou o patrão usa o padrão para te manipular?
Eu só reconheço gente querendo ser patrão. Mas nem o patrão eu posso reconhecer, mais.
O padrão eu reconheço como cacoete dentro de mim e de ti, e de todos nós.

Complementando o óbvio - mas que talvez nem todo mundo tenha se dado conta (fazendo referência ao que foi escrito nesse texto:
http://multiplas-personas.blogspot.com.br/2014/02/a-abstracao-garantindo-inexistencia-na.html)


A Abstração Garantindo a Inexistência (na hora errada)

Abstrair.
Abstrair para aguentar coexistir nesse mundo cheio de merdas. Por que? Para garantir nossa existência.
Mas são essas merdas que sufocam nossa existência. Se são essas coisas todas que não nos deixam existir. Todos esses problemas.
Abstrair,
você tem que aprender a abstrair todo o sofrimento que não é seu, do contrário, será engolido. Do contrário, você será trucidado. Do contrário, você não sobreviverá.
O problema é que "eu" cansei de "sobreviver".
Eu já sobrevivi quando eu tinha 12 anos. Todos os dias de manhã eu acordo e tomo um remédio para continuar sobrevivendo. E minha sobrevivência está garantida. E cansei de ver pessoas se conformando em sobreviver, quando elas poderiam plenamente viver, e plenamente não existir.
Continuará abstraindo toda a ignorância do mundo em nome de bens materiais e em nome de uma "paz" que não é paz, mas que é egoísmo disfarçado. De uma satisfação que não satisfaz, de uma plenitude que é vazia porque não é plenitude, porque é transbordamento disfarçado de plenitude. Porque não é satisfação, e não é felicidade, são apenas subterfúgios.
A gente vê tudo, a gente sente tudo, a gente entende tudo. Mas a gente foi adestrado para filtrar, e para abstrair aquelas coisas que vão doer. A gente vê tudo, a gente sente tudo, a gente entende tudo. A gente foi adestrado para abstrair o que não concordamos, a dissimular a indignação que sentimos ao ver algo inadequado, a conter nossos impulsos de ação para mudar nossa realidade, e a dissimular nossa raiva através de uma postura polida e diplomática, que nada tem a ver de fato com virtude, mas que é apenas uma forma de nos proteger de sermos trucidados por sermos tão sensíveis e tão absorventes de tudo o que acontece - e sim, todos nós somos, em menor ou maior grau. Todos nós somos esponjas do nosso ambiente.
Essa indignação, essas sensações desagradáveis que a gente filtra diariamente sem nem perceber, como decepção, medo, raiva, tristeza, desesperança, desamor... Essas sensações que ao invés de serem usadas como incentivo para agirmos e mudarmos nosso mundo, são filtradas sem percebermos e guardadas em algum lugar da nossa mente, transformando-se em doenças, em problemas psicológicos ou psiquiátricos - e não é à toa que cada vez mais o DSM (agora, na quinta edição) cresce e é sempre reformulado (da última vez que ouvi uma discussão a seu respeito, inclusive quem "ri demais" pode ser enquadrado em alguma classificação de transtorno psiquiátrico). - Porque é necessário que a gente abstraia tudo aquilo que foge ao nosso padrão.
Seja ele um padrão de comportamento, seja um padrão de realidade, seja um padrão de vida e de felicidade.
Felicidade é estarmos todos andando da mesma forma, seguindo os mesmos princípios, comendo a mesma comida pronta feita em laboratório, andando com as mesmas roupas, curtindo as mesmas coisas, pensando do jeito que pensávamos há 10 anos atrás, agindo da forma como agíamos há 10 anos atrás, vivendo da forma como vivíamos há 10 anos atrás, seja individualmente ou de forma coletiva.
Felicidade é abstrair tudo aquilo que não respeita o nosso ideal de realidade, e, embora a gente encha a boca para dizer que nos mantemos informados, que a gente busca informações para saber como está o mundo, para termos consciência de que ele está piorando ou melhorando, por mais que a gente diga que estamos cientes de todo o lixo que existe por aí - tentando assim reafirmar que não somos iludidos - continuamos vivendo como se já vivêssemos no mundo ideal, onde todos são felizes, onde ninguém sofre, onde ninguém está bem longe do seu ideal, e não fazermos nada para mudar isso.
Isso é viver? Ou isso é sobreviver?
Isso é existir? Ou isso é ser artigo de decoração de algum cara com mais poder e mais grana do que nós?
Isso é inexistir como eles dizem que tem que ser.
Qual a tua forma de existir?
E qual a tua forma de inexistir?

Paremos de abstrair e aqueles que nos manipulam se dobrarão, pelo medo que eles mesmos geraram em nós, e os fios que nos aprisionam serão rompidos. Amém.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

De volta

A jornada recomeçou.
A trilha me mostrou um dilema:
o real versus o ilusório.
O que é real nesta floresta?
O que apenas parece ser real?
Será que algo é, de fato, real?
Ou seria tudo uma ilusão?
Se tomarmos tudo como uma ilusão, é mais fácil de nos libertarmos desse sofrimento.
Entretanto, será mesmo necessário andarmos pelos extremos?
Os extremos não seriam também, dentro de suas formas, ilusões?
Encarar a vida assim, como uma ilusão, não seria uma forma de aprisionamento?
O caminho precisa mesmo ser assim tão amargo?
Não seria ele uma prisão?
Entretanto não se pode esperar que o caminho seja o resultado. Ou será que podemos?
Já ouviu dizer que existe mais de uma solução para o mesmo problema?
Mais de um caminho para o mesmo destino?
Já ouviu dizer que você pode criar o caminho, caso ele não exista?
E isso, não necessariamente rompendo com a estrutura da floresta... Mas se adaptando à ela.
Anoiteceu e estamos tateando no escuro. Ainda mais necessária é esta adaptação, pois ainda mais arriscado é o andar pela floresta.
É possível criarmos o caminho novo. Um caminho mais leve, mais tranquilo, mais sereno ou, pelo menos, menos amargo. Menos difícil, por que não? Haverá sofrimento? Sempre há. Cansaço? Sim, sempre. Porém, podemos caminhar pela sombra. Nos banharmos na cachoeira. Curtirmos o pôr-do-sol. Encontrarmos uma fruta doce e suculenta. Coisas para nos aliviarmos. E quem sabe, pisarmos numa terra mais macia? E o caminho se tornar instantaneamente mais gostoso. Por que isso deve ser considerado preguiça? Ou querer fugir do problema?
Isso não impedirá a picada dos mosquitos. Nem pisarmos em espinhos. Nem nos machucarmos com gravetos, pedras ou bichos, da floresta. Mas precisamos nos atirarmos voluntariamente nos espinhos? E, caso tenhamos nos atirado (por necessidade), seria necessário ficarmos rolando em cima deles e não cuidarmos da nossa pele? Deixarmos infeccionar?
Precisamos bater com o pé na pedra? E, se precisamos entender como é a dor de bater com o pé na pedra, seria necessário continuar batendo? Lembrarmos da dor toda a noite, antes de dormir? E nos castigarmos por isso, de outras formas? Passar fome porque batemos na pedra? Porque nos machucamos em espinhos? Andar debaixo do sol escaldante do meio dia porque erramos? Porque nos ferimos?
Existem muitos caminhos para chegar ao mesmo destino. E muitas formas de percorrer cada caminho.
De volta à jornada, anoiteceu, e estamos cansados. Há uma cachoeira em frente, frutas ao redor, grama fofa e nós temos, agora, como fazer fogo. Como nos cobrirmos. Já passamos frio o suficiente, e já entendemos a necessidade de nos cuidarmos. E como nos cuidar.
Boa noite.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Pausa na jornada.

Quando iniciamos a jornada para dentro de nós mesmos, o início parece demasiado raso.
Parece superficial, sem ter tantos segredos....
Desconhecemos a floresta gigantesca que nos espera.
Vencer o medo é o primeiro desafio, que será eterno, pois o medo sempre está permeando tudo, e muitas vezes ele é negado, também por medo.
Nos dias de hoje, o medo é incentivado, estimulado, gerado.
A coragem é mascarada sob outras formas. Corrigindo: outras coisas se fazem passar por coragem.
É impossível retornarmos desta jornada intactos. Retornar exatamente como éramos antes.
O auto-conhecimento é uma construção diária, é um trabalho diário de abrir janelas, abrir portas, fechar janelas, fechar portas, construir e descontruir muros, e as vezes, apenas observar o movimento interno.
Somos feitos de universo, desconhecemos o que há dentro de nós assim como desconhecemos o que há por aí, fora de nós. Sob o oceano, entre as estrelas, ou além dos buracos-negros.
A floresta é a melhor figura para associarmos com o inconsciente, com a nossa essência e com a nossa profundidade.

Chegou a hora de pausar a jornada, que já acumulou muitos acidentes: cortes, tombos, dores diversas que foram se acumulando e sendo ignoradas, e agora estão latejando o corpo todo. Chegou a hora de pausar esta jornada e banhar-se na cachoeira, tentar relaxar o corpo e recuperar-se.
Alimente-se, respire fundo, procure descansar sob o sol do amanhecer. Coma uma fruta leve, banhe-se nas águas refrescantes. O calor - o fogo transmutador - agora castiga as mentes mais sensíveis, os corações mais sensíveis. Mantenha-se leve. Respire fundo novamente, observe o verde, os raios de sol, os animais em sua força. Durma, deite-se e durma, descansando para continuar quando estiver melhor.
A pausa é sábia. Não é preciso pressa na caminhada dentro de si.