quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A identidade é uma prisão

A identidade é uma prisão. Isso mesmo que você ouviu.
Ao ler este texto, esqueça da importância da identidade como formadora da sociedade.
Esqueça da importância da identidade como um elo do indivíduo com seu grupo.
Esqueça tudo o que você já aprendeu sobre a identidade, sobre a personalidade.
Abra-se para uma nova forma de encará-la: como uma prisão.
Estamos aprisionados ao que? pelo que? por que? como?
Provavelmente são essas as perguntas que passeiam pela sua cabeça neste momento. Não é mesmo?
Algumas mais fáceis de responder, outras nem tanto. Mas ao invés de responder pontualmente cada uma delas, vamos elaborar mais a respeito da identidade como papel definidor na sociedade.
Alguém, algum dia, deu-se conta de como os seres humanos são apegados à sua imagem, à algo que os defina individualmente, uma personalidade que precisam manifestar neste planeta. Cada um quer manifestar sua persona de forma individual, mas integrada ao coletivo. Sempre foi assim. Começamos com esse culto à casca desde que somos bem pequenos. Talvez ele seja formado com as primeiras lições - traduzidas como "isso é feio!" - e acabam se estendendo naturalmente como diretrizes. Isso é feio aos olhos dos outros. A diretriz aqui é o que os outros vão enxergar: a sua identidade. O abismo é entre o que quer ser e o que de fato é.
Entretanto, por mais que a gente sempre pareça algo, no fundo nos apegamos à identidade - ou talvez, ao ideal de identidade - que temos e é através dela que nos guiamos - pois na falta de uma mãe para nos dizer "isso é feio" temos nossa identidade como guia para nossas ações.
Fato é que alguém percebeu o quanto a "mãe-identidade" está atrelada ao ser humano que deve ter pensado "por que não me aproveitar disto?". E aí, meu caro leitor, pense em tudo o que gira ao seu redor, tudo, especialmente o que é ligado à propaganda, às vendas: este "tudo" está se aproveitando do SEU ideal de identidade. Do nosso ideal de identidade. De UM ideal de identidade que não necessariamente é meu ou seu ou nosso, mas que foi provavelmente imposto.
Difícil engolir essa teoria de lavagem cerebral?
Difícil mesmo, concordo.
Entretanto a identidade imposta à nós também é esperta o suficiente: ao mesmo tempo em que ela coloca-nos dentro de seus padrões - os padrões que são interessantes ao "famoso" sistema (da qual não tomamos conhecimento mas que simplesmente influencia em 90% do nosso tempo) - também vende, por outro lado, a ideia de que não devemos nos preocupar com a opinião alheia. Assim, ela cria uma falsa imparcialidade.
Estamos, por fim, aprisionados num padrão social que nos é imposto e, de olhos vendados. Seguimos reforçando nossa identidade, procurando algo para ser nossa diretriz, a matriz que todos perdemos com o parto.
Agora chegamos ao ponto alto desse texto: o objetivo.
O objetivo é claro: ao tomar uma forma para si mesm@, este ser acaba limitando-se sobre todas as possibilidades de ser.
Numa escala de mercado, impede o médico de ser taxista (e vice-versa). Impede o professor de matemática de ser enfermeiro. Impede o artista plástico de ser cientista. Não são admitidas múltiplas personas. PRECISAMOS nos definir dentro de uma carreira. Dentro de uma profissão. Dentro de uma especialidade. E para nos definirmos precisaremos na maioria dos casos passar por algum treinamento - que nos tomará uns bons anos de estudo; ou precisamos estar enquadrados numa empresa, numa loja, numa carga horária específica, com moldes específicos de comportamento e exigências pré-definidas, que te definem dentro dos teus dias - te obrigando a planejar o que vai fazer amanhã, depois de amanhã, daqui há um mês ou nas próximas férias de verão (sendo que estamos a recém em abril). Assim, não basta nos definirmos dentro de uma identidade, mas também precisamos definir o nosso tempo futuro - que não é nada além de uma (vazia) promessa.
Numa escala social, o pai de família não pode ser o amigo baderneiro.
A mãe de família não pode infinitas coisas impostas pelo machismo.
A filha mais velha deve dar o exemplo e seguir numa carreira de sucesso.
Pessoas comuns não podem ser políticas - nem verdadeiramente politizadas.
E os políticos não serão tratados como pessoas comuns.
E o seu vizinho não será o revolucionário - e nem você, pois agora é o estudante universitário de advocacia que trabalha no escritório e está no sétimo semestre, encaminhando sua vida para um futuro promissor.
Numa escala emocional, a identidade te reprime à opções. Ninguém quer amar o imprevisível, pois não sabemos o que esperar do imprevisível. Afinal, nossa identidade exige que outros tenham identidade, alimentando a prisão que a aprisiona e assim o mundo será um lugar seguro, onde conhecemos tudo - como se fosse possível padronizar o ser humano, independente de quantas coisas ele afirme, continuará constantemente mudando, e só um tolo para acreditar que é sempre o mesmo. Ignoraremos portanto nossa própria inconstância ao desconsiderarmos a inconstância alheia. Ignoraremos nossa própria essência transformadora de nós mesm@s e do mundo ao nosso redor.
Estendendo essa aversão ao imprevisível para um olhar mais político e social, é muito mais fácil controlar aquilo que conhecemos. O desconhecido nos gera ansiedade. O desconhecido nos traz receios e a certeza de que poderemos perder. Um mundo cheio de pessoas imprevisíveis é como uma mata, uma selva, uma floresta densa. E não é à toa que nossas florestas estão progressivamente sumindo...
A identidade é uma prisão: pois no momento em que nos definimos como "x" não poderemos concomitantemente sermos "y". Pois no momento em que nos enquadramos - nós, seres tão complexos, seres que ignoram sua própria origem, que desconhecem seu verdadeiro lar e, aqui nesta dimensão procuram tatear, no escuro, por pistas de sua essência -, no momento em que entramos na caixa da identidade, suas laterais todas são como barreiras à imensidão, ao infinito, ao universo... à onipresença e à própria divindade, presente em cada um de nós não sob o sentido religioso, mas sim, com o sentido unificador de povos, revolucionário de sua realidade e das realidades que o cerca. Divino no sentido de poderoso e de capaz, pois temos potencial imenso para modificar nossas vidas e as dos que estão à nossa volta: modificamos a vida de diversas pessoas sem nem nos darmos conta, pela nossa simples manifestação. Nossa vida foi, é e será modificada pela influência dos demais (e suas milhões de identidades). Também será modificada sempre por aqueles que entenderam da influência que a identidade tem sobre nossos diminutos seres - incluindo, aí, o atual sistema em que vivemos.
Tente recordar se, em sua vida, sua presença já alterou algo na vida de alguém, por menor que isto seja, por mais sutil que isso seja. Isso de fato já aconteceu, não é mesmo? Provavelmente sem que você tivesse percebido, não é mesmo? Seu contato com outrem de alguma forma alterou o percurso desta pessoa.
Então imagine esse potencial sendo aplicado de forma criativa, transformadora e renovadora de MUNDOS. Pois é, você pode.
Você, que originalmente não sabe de onde vem, nem pra onde vai, mas que surgiu dessa mesma farinha da qual deu origem à todos nós. E no final é isso que importa. Libertando-nos assim da identidade que nos aprisiona, da segurança que nos sufoca e nos amortece, que nos impede de retornar ao nosso estado de total plenitude, seremos capazes de preencher as lacunas do mundo, o próprio mundo e nossa existência.
Vá em frente, farinha do mesmo saco. Faça melhor a cada dia: faça sempre diferente, enlouqueça e fuja dos padrões. Não seja você. E não seja você. E também não seja você. E não seja eu. Seja uma legião. E não seja a legião. Seja nada. Ou, simplesmente seja: o universo manifestando-se livre do ego!
A (in)existência plena.

Nenhum comentário:

Postar um comentário